“Entrevistas sobre a Amazônia” discute titulação de terras com Girolamo Treccani
Por Élida Galvão
Ascom Fundo Dema
Em sua quarta edição (março/2014), o periódico virtual Série de Entrevistas sobre a Amazônia traz à luz o debate sobre a regularização fundiária no Baixo Tocantins e o título de posse como estratégia dos movimentos sociais. Em entrevista com Girolamo Treccani é possível compreender como são traçadas as dificuldades para a regularização fundiária diante da ocupação de trabalhadores(as) rurais e populações tradicionais em terras do município.
Com mestrado em Direito e doutorado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido, ambos pelo Núcleo de Altos Estudos da Amazônia, da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA), Girolamo destaca que o problema fundiário se edifica no período colonial, sobretudo com as sesmarias, e se prolonga pelo período imperial até os dias atuais. Porém, a situação se agravou bastante ao longo desses anos e até hoje a agricultura de subsistência sofre com o coronelismo fundiário, responsável pelo alarmante cenário de violência no campo, social e ambiental, atingindo não somente comunidades extrativistas e ribeirinhos, mas também indígenas e quilombolas.
De acordo com o professor, o problema da apropriação ilegal de terras públicas persiste pelo fato da titularidade dessas terras ter sido distribuída de forma indiscriminada desde os tempos do Brasil colônia. Com isso, o Sistema de Regularização e Titulação de Terras registra, atualmente, cerca de 15 tipos diferentes de titulação de terra. Diante da situação, nem mesmo o governo federal consegue identificar quais e quantos documentos foram emitidos durante todos esses anos.
Destaca-se, ainda, que o avanço do monocultivo do dendê no Baixo Tocantins tornou mais desordenada a situação fundiária. Isso porque no Brasil não existem dados consolidados sobre a localização das plantações e a quem pertence o plantio. Com isso, simples escrituras de posse são comercializadas, acirrando os conflitos no campo.
A deficiente transparência de informações é outra questão levantada por Treccani. De acordo com ele, a maioria dos institutos fundiários e ambientais deixam de disponibilizar dados importantes de processos em tramitação, localização dos processos, assim como títulos, tamanhos e nomes. É fundamental que a sociedade diga: Eu tenho o direito a saber! Existe uma lei que está em vigor que me dá o direito de saber tudo aquilo que é patrimônio público, enfatiza ele, se referindo à Lei de Acesso à Informação, promulgada em novembro de 2011.
Porém, firme no posicionamento de que a terra é um bem comum, portanto, pública e direito de todos, Girolamo aponta a necessidade de o movimento social construir estratégias no sentido de exigir do poder público para que obrigue os grileiros a apresentar documento que comprove a legítima desassociação daquele imóvel do patrimônio público.
Com o objetivo de reverter o quadro atual sobre a titulação de terras, Girolamo defende que cada sindicato tenha um computador, para que possa registrar as Unidades de Conservação, as terras indígenas, os projetos de assentamento, e assim contribuir para um monitoramento eficaz. Essas informações têm que fazer parte do dia-a-dia da sociedade e, em especial, dos sindicatos, que são os representantes maiores dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras. De posse disso, aí sim, dá para organizar as políticas públicas em suas diferentes dimensões. Penso esse é um passo fundamental, conclui.
Periódico
A Série de Entrevistas sobre a Amazônia é uma publicação da ONG FASE Programa Amazônia e conta com o apoio do Fundo Dema, da Fundação Heinrich Böll e da Fundação Ford. O objetivo é divulgar ideias, posicionamentos e/ou avaliações de lideranças de movimentos sociais, pesquisadore(as) e de membros de ONGs acerca de temas que se considera importante para a compreensão das novas dinâmicas socioterritoriais em andamento na região, e também de experiências coletivas executadas por organizações da sociedade civil, para que sejam amplamente conhecidas.
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