Indígenas Arapiun lutam pela segurança alimentar na aldeia Nova Vista
Por Élida Galvão
Vivendo em uma região ameaçada pelo agronegócio e pela exploração da mineração, famílias indígenas da etnia Arapiun representam um dos grupos de resistência na Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns, em Santarém (PA). De forma a garantir a alimentação da comunidade, 29 famílias da aldeia Nova Vista passaram a desenvolver o projeto ‘Sistema Produtivo Caipira Nova Vista’, voltado à recuperação de áreas degradadas com o plantio diversificado de espécies frutíferas e plantas nativas florestais, e ainda a criação de galinha caipira.
Atualmente com cerca de 70 residências, o território da Terra Indígena Nova Vista é composto por dezenas de árvores centenárias de diversas espécies, como Ypê, Andiroba, Castanha do Pará, Açaí, Pequi, Cajá, Tucum, Bacaba, Patoá.
| As queimadas na floresta, provocadas pelo aquecimento climático refletem na escassez da caça para os indígenas
No entanto, a partir da recuperação de 50 hectares¹ de áreas degradadas, a iniciativa do projeto contribui não só para a transformação da cobertura vegetal, favorecendo as condições climáticas, o equilíbrio do meio ambiente, a preservação do bioma Amazônia, como também qualifica e garante a alimentação saudável à população local.
“A gente tá vivendo um tempo meio complicado. Antes era muito fácil pegar um peixe, entrar no mato e pegar uma caça. Hoje tá muito complicado isso lá. O nosso objetivo é trazer o alimento para a nossa comunidade, aumentar a nossa renda porque lá é uma área de difícil de emprego, de trabalho e a gente tendo esse projeto, vamos conseguir muita coisa com ele, principalmente em questão da alimentação“, relata Kelwis Corrêa, presidente do Conselho Indígena Aldeia Nova Vista, entidade que representa os indígenas da comunidade.
Ameaças
Com limitações no acesso a políticas públicas, os indígenas Arapiun de Nova Vista resistem às pressões dos grandes projetos, lutando cotidianamente contra a invasão de seu território, a retirada ilegal de madeira, a pecuária extensiva, o monocultivo, a mineração em sua área, por exemplo; práticas muitas vezes desenvolvidas com o consentimento governamental, que degradam o meio ambiente e desterritorializam os povos e comunidades tradicionais.
Essas atividades refletem direta e negativamente sobre o modo de vida das comunidades localizadas no território. Há alguns anos, o município de Santarém vem se tornando rota de escoamento de commodities com a chegada de multinacionais e consórcio de empresas que disputam espaço com a população local para promover o desenvolvimento do capital globalizado, deixando destruição em larga escala aos povos da floresta e a usurpação dos Bens Comuns.
| Famílias da aldeia Nova vista se unem para construir o aviário e garantir a segurança alimentar na comunidade
As ameaças se tornam mais intensas pela falta da demarcação do território. O encaminhamento para este processo encontra limites ainda dentro da própria comunidade, com conflitos internos sobre o reconhecimento indígena entre as famílias da localidade. Além disto, a carência do acesso à informação por meios de comunicação como rádio, internet, telefonia, por exemplo, também contribui para a desarticulação das populações da floresta, favorecendo os interesses mercadológicos de grandes corporações e do agronegócio com a negação do direito à terra indígena.
“Nós precisamos principalmente de apoio em relação à formação. Lá é um local de difícil acesso, principalmente tecnológico, de internet e a gente precisa muito de informação porque a gente tá trabalhando com agricultura”, diz Kelwis.
Resistência
Contrários às produções que destroem a natureza, os indígenas de Nova Vista vivem basicamente da produção agrícola familiar, com a produção de farinha, a criação de pequenos animais, a pesca e a coleta de frutos. A partir do desenvolvimento do projeto – executado por meio do Conselho Indígena Aldeia Nova Vista (COINOVA) com o apoio do Fundo Indígena do Xingu (FIX) e do Fundo Dema em parceria com o Fundo Amazônia –, as famílias tiveram a oportunidade de construir o aviário para a criação de galinha caipira e o viveiro para criação de mudas a serem plantadas definitivamente no entorno deste aviário.
Contando com a parceria do Centro de Apoio de Apoio a Projetos de Ação Comunitária (CEAPAC), os indígenas participaram de oficinas para a aprender o processo de criação de aves e a produzir ração alternativa para a alimentação destes animais. De acordo com Telvez, inicialmente foram adquiridos 860 pintos de galinha caipira e cerca de 800 mudas de espécies frutíferas. Porém, segundo ele, ainda é preciso garantir a compra de uma forrageira, equipamento onde são misturados os componentes necessários para a produção da ração orgânica.
A princípio, para além de garantir a segurança alimentar das famílias, o grupo quer proporcionar qualidade de alimentação às crianças da escola que fica na aldeia, a partir da inserção ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Dando início ao alcance desta meta, as famílias já construíram o viveiro de mudas e agora estão aguardando o período de chuva para dar início à plantação, o que facilita a irrigação.
_________
¹ Matéria alterada em 22.12.17 para a correção da informação de hectares