Banquetaço Solidário é realizado em Santarém
A ação promoveu a valorização da agricultura familiar com a distribuição de mais de nove toneladas de alimentos
Por Élida Galvão
Em mais uma ação do Banquetaço Solidário, cerca de 9,5 toneladas de alimentos são distribuídas no município de Santarém (PA). Realizado na manhã de ontem (30.03), no bairro Vigia, a ação beneficiou mais de 500 famílias e também dialogou com a comunidade sobre o retorno do Brasil ao Mapa da Fome.
Em uma tarde chuvosa, centenas de famílias estiveram presentes na Igreja de Santa Luzia, para receber alimentos de verdade, sem agrotóxicos, produzidos por agricultoras e agroextrativistas das Associações de Mulheres Trabalhadoras Rurais dos municípios de Santarém, Belterra e Mojuí dos Campos.
Jerimum, batata doce, macaxeira, goma de tapioca, farinha de mandioca, pimenta de cheiro, pupunha, pepino, limão, abacaxi, banana e laranja foram alguns dos produtos fornecidos para abastecer as mesas das famílias do bairro. Somente de alimentos orgânicos e agroecológicos, foram doados, aproximadamente, 6,6 toneladas, e que ainda foram complementados com, aproximadamente, três toneladas de alimentos não perecíveis, como arroz, macarrão, óleo, feijão e açúcar, além de produtos de higiene e limpeza.
“Me senti muito feliz e estou muito agradecida. Os alimentos chegaram em boa hora porque eu estava precisando. Tenho cinco filhos e eu e meu marido estamos desempregados”, diz Cleuma Silva, 38 anos, moradora do bairro Vigia.
De acordo com Claudia Santana, presidenta da Associação dos Moradores do Bairro Vigia (AMBAVIG), o bairro vive uma realidade de extrema vulnerabilidade social e econômica. As duas ocupações que integram o território carecem de assistência à saúde, saneamento, não há asfaltamento e nem transporte coletivo.
“A gente procura meios alternativos para amenizar o sofrimento da população. O bairro tem um grande índice de mães sozinhas, que antes da pandemia tinham o auxílio das creches. A maioria das crianças vai para escola para comer e durante a pandemia a alimentação ficou comprometida. No bairro, a gente vê a realidade nua e daquelas mulheres”, explica Cláudia.
De acordo com a presidenta, o trabalho executado à frente da entidade é voltado para o bem estar da população e prioriza os grupos de idosos, mães sozinhas, pessoas adoentadas e desempregadas. Foram estes os critérios de seleção das famílias beneficiadas com as cestas de alimentos. “Fiquei muito grata, deu para atender todas as famílias que estiveram presentes. Era muita gente para atender, mas contamos com grupos de voluntários que chegaram espontaneamente para ajudar”, destaca.
Desempregada, Rilda de Sousa, 40 anos, diz que o aumento dos preços dos alimentos tem impossibilitado o acesso das famílias à alimentação adequada. “Ficamos muito felizes em receber a cesta. Muitas pessoas não tem nada em suas casas. Só uma lata de óleo custa entre R$10 a R$11. A gente tem que economizar. Se não tem trabalho, não tem de onde tirar.
Cenário de fome
Sete anos após ter saído do Mapa da Fome, o Brasil retorna a este cenário durante o governo de Jair Bolsonaro. São mais de 19 milhões de pessoas passando fome e mais de 55% da população brasileira em situação de insegurança alimentar, conforme dados da rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e segurança Alimentar e Nutricional – Rede Penssan, revelados em dezembro de 2020.
O quadro de fome e miséria é agravado pelo desmonte das políticas públicas sociais e de segurança alimentar, como o Bolsa Família, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), além do Conselho nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), extinto no primeiro dia de mandato de Jair Bolsonaro.
“É preciso denunciar que não apenas a pandemia foi responsável pelo país ter voltado ao Mapa da Fome, mas a causa está, principalmente, no desmonte das políticas públicas, como o PAA, o PNAE. O país já vinha saído desse contexto. Eram políticas de valorização da agricultura familiar, somadas a outras medidas sociais, de transferência de renda, como o Bolsa família, que oportunizavam a saída do cenário de fome, de insegurança alimentar”, argumenta Graça Costa, Presidenta do Comitê Gestor do Fundo Dema.
Para a educadora, a ação voltada à distribuição de alimentos responde a uma questão urgente de solidariedade com que passa fome, mas também de valorização da agricultura familiar. “O Fundo Dema não faz essa ação sozinho. Existe uma rede de articulação que faz o que o Estado deveria fazer, valorizar o que foi desmontado. Isso porque 70% do que tem nas cestas de alimentos são produtos do campo, agroecológicos, sem veneno. Esta ação valoriza a produção da agricultura familiar e, sobretudo, valoriza o protagonismo do trabalho das mulheres”, considera Graça.
Protagonismo das mulheres
Grande parte dos alimentos que compunham as cestas foram produzidos por mulheres da Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santarém (AMTR), Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Município de Belterra (AMABELA) e Associação de Mulheres Agricultoras Familiares de Mojuí dos Campos – Flores do Campo. São mulheres que atuam no fortalecimento da agroecologia, na defesa do território e na garantia do Bem Viver.
“Foi uma felicidade ver o nosso trabalho sendo valorizado. Foi muito bom saber que a nossa produção chegou à mesa das pessoas que estão passando fome”, relata Veralícia Nunes, que integra a AMABELA
Para Marta Campos, representante da AMTR, o momento significou a concretude da solidariedade e da segurança alimentar e nutricional. “Além de fornecermos uma produção saudável, sem veneno e agroecológica, os alimentos vão saciar a fome de quem está passando necessidade”.
“Agradecemos pela oportunidade em promover mercado para a produção agroecológica das mulheres. Foi gratificante saber que essas famílias puderam se alimentar de produtos saudáveis e de ter contribuído com essa ação solidária”, pontuou Sileuza Nascimento, representante da Flores do campo.
Organizado pelo Fundo Dema e Fase Amazônia, o Banquetaço Solidário contou, também, com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém (STTR-STM), Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras familiares de Mojuí dos Campos – PA (STTR-MC-PA), Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento Lago Grande (FEAGLE), Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária (CEAPAC) e Federação das associações de Moradores e Organizações Comunitárias de Santarém (FAMCOS). Além do Baixo Amazonas, a ação se estende a outros territórios de atuação, como Transamazônica, BR 163 e Nordeste Paraense.