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17/11/2022
Por: Equipe Fundo Dema
Assunto: Geral
Leitura: 4 minutos

FASE e Fundo Dema realizam seminário ‘O cultivo da economia feminista através da Caderneta Agroecológica’

por Tatiana Ferreira Reis

FASE e Fundo Dema atuam no monitoramento de 88 cadernetas agroecológicas nas regiões do Baixo Tocantins e Nordeste Paraense. Foto: Tatiana Ferreira Reis

A troca de experiências e saberes sobre a agroecologia e o uso das Cadernetas Agroecológicas motivaram a reunião de 54 mulheres de onze territórios das regiões Nordeste e Baixo Tocantins, no Pará. Entre os dias 14 e 16 de novembro, aconteceu,  em Belém, o seminário “O cultivo da economia feminista através da Caderneta Agroecológica”, organizado pela FASE Programa Amazônia e pelo Fundo Dema, com apoio da Climate and Land Use Alliance (CLUA) e Action for World Solidarity (ASW).

Maria Emília Pacheco, assessora e pesquisadora da FASE, conduziu a atividade realizada no dia 15 e enfatizou a importância da economia feminista para combater o empobrecimento da população do campo, assim como o crescimento da fome, que atinge mais 33 milhões de brasileiros e brasileiras atualmente. “A partir dos registros nas cadernetas conseguimos mostrar que a produção das mulheres precisa ganhar visibilidade. Muito do que é consumido nas casas é fruto do trabalho não remunerado das mulheres, o que ficou escondido por muito tempo na história da economia. As políticas ignoraram essa produção tão importante para o autoconsumo, para as trocas, vendas e doações por muito tempo”, explicou a pesquisadora, que esteve no Pará pela primeira vez em 1975.

Maria Emília Pacheco, dialogou sobre a importância das cadernetas agroecológicas para a visibilidade do trabalho das mulheres. Foto: Tatiana Oliveira

Daiane Araújo, do território agroextrativista Pirocaba, em Abaetetuba, contou que a experiência de participar do seminário “traz conhecimentos e reforça a esperança e a força pra lutar pela agroecologia. Há dois anos faço minhas anotações na caderneta e integro essa luta pela alimentação saudável. Quero que, no futuro, minha filha também tenha oportunidade de passar pela formação social e política. Incentivo desde agora porque sei que é fundamental pensar nas próximas gerações”, reflete.

Para Jaqueline Felipe, educadora da Fase Amazônia, o seminário realizado em Belém foi um marco.  “Reunimos o público ligado à rede de articulação do Fundo Dema e a acompanhados pela Fase no Nordeste Paraense e no Baixo Tocantins. Participaram 54 de um total de 88 mulheres inclusas no monitoramento da produção dos quintais agroflorestais por meio das cadernetas, em 11 territórios”, observou.

Além de ganharem uma percepção mais ampla dos processos agroecológicos em que estão inseridas, as mulheres que participam dos seminários e formações são estimuladas a prosseguir e incentivar a participação de outras mulheres quanto ao uso da caderneta agroecológica. “Percebemos que há um salto nas anotações e reorganização das cadernetas com esses encontros e a animação segue com elas para os territórios. Sair da rotina é muito importante. Elas sentem-se valorizadas, melhora a autoestima e percebem que seus conhecimentos são importantes, como observamos aqui com as plantas medicinais. Todas possuem muitas espécies de plantas medicinais em suas areas e gostam de compartilhar e multiplicar os saberes dos usos destas plantas”, conclui Jaqueline.

Apresentação do Mapa da Sociobiodiversidade produzido por cada comunidade presente. Foto: Tatiana Ferreira Reis

Rosineide dos Santos, da comunidade quilombola de Camiranga, no município de Cachoeira do Piriá, Nordeste do Pará, participou pela primeira vez de um evento de formação da Caderneta Agroecológica em Belém. Ela trabalha durante a maior parte do ano com a coleta de sementes de andiroba e produz artesanato com menos frequência. Conta que desde quando iniciou as anotações na caderneta, a alimentação de toda a família também ficou mais saudável.

“Com a participação de toda a família, passamos a valorizar o que temos no terreno, como açaí, cupuaçu e bacuri. Temos preocupação com a preservação. Também entendi que tudo isso faz muita diferença na nossa economia. Estou muito feliz por ter participado deste seminário em Belém. Muito bom receber e doar conhecimentos e saberes que vamos usar e multiplicar nos nossos territórios”, observou Rosineide.

Caderneta Agroecológica

A Caderneta Agroecológica foi criada, a princípio como instrumento de formação, pela equipe do Programa Mulheres e Agroecologia, do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA-ZM), juntamente com as agricultoras da região, a partir de 2013.

Apresentada em um formato simples, ela possui quatro colunas para registrar, quantificar e precificar as informações sobre a produção. Ou seja, nela são registrados o que foi vendido, o que foi doado, o que foi trocado e o que foi consumido de tudo o que é cultivado nos quintais produtivos e/ou espaços de trabalho das mulheres em seus territórios.

Trocas de mudas e sementes trazidas por mulheres de diversas comunidades. Foto: Tatiana Ferreira Reis

Entre 2017 e 2018, o Grupo de Trabalho de Gênero da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) desenvolveu o monitoramento de 264 Cadernetas de maneira coletiva, com o apoio de uma rede de organizações do campo agroecológico e feminista (da Amazônia, Nordeste, Sul e Sudeste). O projeto em âmbito nacional, intitulado “Os Quintais das Mulheres e a Caderneta Agroecológica na Zona da Mata de Minas Gerais e nas Regiões Sudeste, Sul, Amazônia e Nordeste: sistematização da produção das mulheres rurais e um olhar para os quintais produtivos do Brasil” foi executado por meio de Termo de Execução Descentralizada (TED), inicialmente entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e a Universidade Federal de Viçosa, por meio da Funarbe.

Desde então, a Caderneta Agroecológica se transformou em um instrumento político-pedagógico de busca da visibilidade ao debate de gênero no campo, contribuindo para diversas ações feministas de auto organização das mulheres. Além de mensurar e dar visibilidade ao trabalho dessas mulheres, a Caderneta também fortalece a sua autonomia.

Oficina de monitoramento das cadernetas no quilombo Camiranga, município de Cacheira do Piriá. Foto: Suelany Silva

Na Caderneta, cada mulher registra diariamente a sua produção sendo co-pesquisadora, buscando mensurar a sua produção, sistematizar os resultados econômicos, monetários e não monetários do seu trabalho, além de visibilizar a diversidade produzida para a sustentabilidade da vida, na promoção da agroecologia, da segurança alimentar e nutricional e da geração de renda.

Entre 2021 e 2022, a FASE, que integrou o monitoramento em nível nacional ligado a ANA como uma das representações da região amazônica, passou a realizar, em conjunto com o Fundo Dema e em parceria com diversas organizações quilombolas e agroextrativistas, o monitoramento de 88 cadernetas no Baixo Tocantins e Nordeste Paraense. O seminário realizado em novembro foi parte constituinte e animadora do monitoramento.