Graça Costa fala sobre a luta das mulheres camponesas durante congresso da FETAGRI
Por Olívia Varela¹
No 10° Congresso dos Trabalhadores Rurais FETAGRI destaca a questão de gênero nos sindicatos
“Somos agricultoras familiares, assentadas, quebradoras de coco, quilombolas, pescadoras, mulher do campo, mulher que vive das águas, que está na floresta, numa relação intrínseca e orgânica com a floresta, e que formam esse mosaico identitário que é a organização das mulheres no Brasil e na Amazônia”
A fala da educadora popular Maria das Graças Costa, presidenta do Comitê Gestor do Fundo Dema, trouxe para a discussão a importância da luta feminista sindical e rural na Amazônia, durante o 10° Congresso dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Pará, que ocorreu nos dias 30 e 31 de março em formato virtual, realizado pela Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Pará (FETRAGRI).
Segundo Graça, a participação das mulheres na luta rural produz resultados políticos e organizativos de grandes conquistas, mas historicamente sofrem um apagamento da sua identidade enquanto seres ativos e protagonistas. “Quero lembrar que alguns anos atrás nós não falávamos disso, nós falávamos ‘a mulher do agricultor’, ‘a mulher do trabalhador rural’, e a própria mulher se via assim, ‘eu sou companheira do fulano’, ‘eu contribuo com meu marido’. As mulheres hoje não falam mais assim”.
Com os avanços da luta feminista no campo, as mulheres se afirmam com a identidade política de trabalhadoras rurais e sentem orgulho de serem mulheres e serem feministas. Isso se evidencia como uma estratégia importante para a conquista de direitos sociais e de reconhecimento dentro da luta rural e sindical.
A MARCHA DAS MARGARIDAS
O movimento da Marcha das Margaridas promoveu o crescimento da luta das mulheres camponesas e na busca por uma pauta comum que estabeleça uma relação social e política equivalente entre homens e mulheres. Em 2019, em Brasília, a manifestação política da Marcha das Margaridas reuniu duas mil mulheres paraenses, junto a outros movimentos sociais, para lutar por soberania popular, democracia, justiça e livre da violência. No ano seguinte, em que completou 20 anos de mobilização, o encontro necessitou se adaptar para o formato virtual e foi realizado por meio de lives devido a situação de pandemia.
Este ano, a Marcha completa 21 anos e se firma com a identidade política de mulheres rurais e rompe com as estruturas hierarquizadas do sindicalismo rural, hegemonicamente masculinizado em número e em pautas e cuja análise de classe é tratada com mais importância do que a análise de gênero, sem considerar a opressão sofrida pelas mulheres. No entanto, hoje é possível ver avanços na consciência dos trabalhadores rurais, muitos deles que já estão em aliança com as mulheres e se somam na luta contra a estrutura patriarcal.
A LUTA NÃO PODE PARAR
A Marcha apontou um tripé: a luta contra a fome, contra a pobreza e contra a violência sexista. Dentro de cada eixo, as organizações coletivas de agricultores, sendo a maioria dirigida por mulheres, têm lutado pela superação das mazelas sociais e atuado de forma combativa às políticas de desmantelamento dos direitos da sociedade e da natureza.
Segundo Graça, o movimento do campo tem lutado pela Previdência Social justa, em defesa dos territórios dos povos e dos bens comuns, da agroecologia e da segurança alimentar e nutricional. Com isso, as mulheres acabam exercendo um papel fundamental de guardiãs de práticas alimentares saudáveis, descobridoras de alimentos que propiciam qualidade de vida para a população e realizam o uso social da biodiversidade. “As mulheres são guardiãs do manejo da biodiversidade e da saúde, elas têm valorizado os produtos nativos da Amazônia”, diz a educadora.
Além disso, as mulheres têm fortalecido uma nova economia, a “Economia Feminista”, baseada na noção de autonomia das mulheres, com estruturas de cooperação no trabalho, ajuda mútua e doação comunitária.
A luta que tem sido levantada pelo movimento feminista camponês precisa do sindicalismo para superar a violência contra a mulher nas estruturas e nos postos de representação sindical. Os avanços conquistados são muito importantes e notórios, mas o patriarcado ainda está presente nas relações sociais e econômicas que se expressam também nas relações dos sindicatos.
Segundo Maria das Graças, é preciso encorajar a denúncia e apoiar mulheres que sofrem violência em todos os campos sociais e, principalmente, reprimir e combater comportamentos machistas e violentos, debatendo o respeito e a equidade entre os gêneros, além de refletir sobre o conceito da divisão social do trabalho e da divisão sexual do trabalho. “Podemos fazer todas as mudanças, econômica, sociais e políticas, mas se nós não metermos o nosso dedo na ferida na injusta distribuição do trabalho doméstico, nós vamos continuar com essa mesma estrutura de desigualdade”, concluiu.
[1] Estagiária, sob supervisão de Élida Galvão
Fonte: Fundo Dema