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14/12/2022
Por: Equipe Fundo Dema
Assunto: Geral
Leitura: 4 minutos

Povos de terreiros do Pará e MPF planejam ações conjuntas de combate ao racismo religioso

Por Élida Galvão

O encontro com povos de terreiros contou com a presença de diversos procuradores e promotores de justiça. Foto: Élida Galvão

A parceria entre o Ministério Público Federal e a Frente de Povos Tradicionais de Matrizes Africanas (Potmas) promoveu o evento intitulado ‘Diásporas e Desafios dos Povos Tradicionais de Matrizes Africanas: Encontro com Povos de Terreiros’, que reuniu afro-religiosos, defensores de direitos humanos, representantes de organizações da sociedade civil e do movimento negro, durante a tarde da última terça-feira (13), em Belém (PA).

O encontro teve o objetivo de dialogar sobre a construção de uma agenda conjunta de combate ao racismo religioso e o planejamento de ações voltadas à garantia de direitos dos Potmas no Pará, afirmando a existência e resistência destes povos na Amazônia.

Da mesa de diálogo participaram o procurador chefe do MPF no Pará, Dr. Felipe de Moura Palha; representantes da Frente Potmas, Bàbá Edson Catendê, do terreiro Ile Omi Ase Ofa Kare, Pai Hamilton Sá Barreto, da coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial na Secretaria de Estado de Educação no Pará (Seduc), e professora Marilu Campelo, coordenadora do GT de Estudos Afro-amazônicos, da Universidade Federal do Pará (UPFA); Dra. Ana Cláudia Pinho, promotora do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (CAO/DH), do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA);  Dra. Manuela Lamenha, da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (MPF); Dra. Maria do Carmo Souza Maia, da Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE).

Reconhecendo a relevância da pauta, o Dr. Felipe de Moura Palha, argumentou sobre a necessidade de traçar estratégias de atuação conjunta no estado inteiro, englobando todas as unidades do MPF no Pará. “O assunto ainda é pouco pautado dentro da instituição, considerando a aplicação à Convenção 169 e a agenda de povos tradicionais. A atuação dentro da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão dos Povos Tradicionais de Matrizes Africanas ainda é algo inovador dentro do MPF”. Para o procurador, é necessário ir além no diálogo sobre o exercício dos direitos culturais de povos tradicionais. “Os direitos fundamentais não estão somente no artigo 5º da Constituição. O passo a mais nessa categorização da manifestação cultural dos povos de terreiro deve ser defendida pelo MPF e MPPA como expressão da diversidade cultual brasileira, que nos dão a obrigação constitucional de defesa. Precisamos quebrar muitos mitos preconceituosos”.

Representantes dos órgãos públicos presentes assumiram o compromisso de promover ações conjuntas no combate ao racismo religioso. Foto: Élida Galvão

Tendo discutido a atuação conjunta para trabalhar as políticas de enfrentamento às violações de direitos e ao racismo religioso, Bàbá Edson Catendê apresentou algumas pautas sugeridas pela Frente de Potmas, entre as quais, regularização fundiária dos terreiros; controle externo da atividade policial e acompanhamento das denúncias; regularização fiscal e tributária; acompanhamento das denúncias de órgãos internacionais de proteção aos direitos humanos; análise dos protocolos de consulta; apoio com ações de cidadania nos terreiros e mapeamento das violações sofridas pelos povos tradicionais de matriz africana. “A Convenção 169 da OIT fala que nós precisamos ser escutados sobre o que a gente quer, sobre o que a gente precisa. Nós somos vítimas do Estado e não queremos ser violentados. Queremos apenas exercer o que a constituição nos garante”, destacou.

Apoio do Fundo Dema para a garantia de direitos dos Potmas

O apoio do Fundo Dema para a articulação dos Povos de Terreiros vem ocorrendo desde a realização da Ação de Solidariedade por Comida de Verdade no Campo e na Cidade, realizada no mês de novembro deste ano, envolvendo mais de 20 terreiros localizados em Belém, Ananindeua, Cotijuba, Outeiro, Santa Bárbara e Colares.

Na ocasião, foram distribuídas mil cestas, totalizando cerca de 30 toneladas de alimentos, em sua maioria agroecológicos, produzidos por agricultores e agricultoras familiares. Além de beneficiar aproximadamente 4 mil pessoas, a ação esteve voltada para a denúncia da situação de fome, do desmonte das políticas públicas voltadas à segurança alimentar e nutricional, também o preconceito e o racismo religioso.

“A construção da Ação de Solidariedade foi um momento de muita partilha, de denúncia dos vários processos de violências, da negação de direitos e, entre eles, o direito à alimentação e à segurança alimentar e nutricional. Partimos daí para o diálogo sobre outras perdas de direitos. A gente tomou a iniciativa de fazer uma proposta mais consistente de levar para a discussão de políticas públicas”, explica Simy Corrêa, coordenadora do Fundo Dema e integrante da Frente de Potmas no Pará.

Encaminhamentos

Os encaminhamentos do diálogo entre a Frente de Potmas e o poder público se deram em eixos temáticos, entre eles, o Eixo sobre violência e Controle Externo da Atividade Policial e o Eixo sobre Reconhecimento dos Direitos Territoriais dos Povos de Matriz Africana, que ultrapassa a dimensão da regularização fundiária, contemplando também o respeito ao culto, à crença e a relação com o território. O aprofundamento do ensino sobre a temática da religiosidade afro-brasileira e as africanidades, assim como a questão da saúde, foram outros pontos pautados para este eixo.

Diante de denúncias sobre condutas sistemáticas da violação de direitos de povos tradicionais por parte da ação policial, a Dra. Ana Cláudia Pinho assumiu o compromisso de resgatar os processos que estão tramitando na justiça estadual a fim de obter um diagnóstico e então propor ações por parte do MPPA. “Já coloco na minha agenda para o início do próximo ano, uma reunião com o coordenador do CAO Criminal, para que possamos reunir com as polícias e articular com as forças de segurança pública ações necessárias para minimamente reduzir essa tragédia contra o povo negro”, disse a promotora sobre ao controle externo da atividade policial.

Segurança alimentar e nutricional

Ao término do encontro, os participantes foram servidos de um delicioso lanche agroecológico, com alimentos produzidos sem veneno, fornecidos por agricultores e agricultoras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Além de sucos e frutas, foram servidos bolo e pudim de pupunha, bolo de milho, tapioquinha, macaxeira cozida, e ainda, acarajé feito por Mãe Juci D’Oyá, representante do terreiro de umbanda Casa de Mãe Herondina.