Projeto da Ferrovia Paraense S.A. não respeita os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais.
Por Élida Galvão
Fundo Dema
| Representantes dos movimentos sociais estiveram mobilizados durante audiência pública ocorrida em Belém
Pressionado pela população que se fez presente na Audiência Pública que deu visibilidade ao projeto da Ferrovia Paraense S.A. (FEPASA), ocorrida nesta quinta-feira (23), em Belém, o titular da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia (SEDEME) encerrou a reunião sem respeitar os processos jurídicos para uma consulta plural e democrática e súplica dos povos e comunidades tradicionais para a descontinuidade do projeto sem antes ouvi-los.
Parecendo não ter conhecimento sobre a diferença entre Audiência Pública e Consulta Prévia, Livre e Informada, como determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Adnan Demachki, explicou aos presentes toda a trajetória da ferrovia e as milhões de toneladas de minério que o Estado pretende exportar. Tudo isso foi apresentado com base nos estudos prévios do empreendimento, feitos sem a participação dos povos indígenas, comunidades quilombolas e demais comunidades tradicionais. Porém, conforme prevê o tratado internacional, especificamente os artigos 6º e 7º, que apontam para a obrigatoriedade de participação destes povos “na formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-los diretamente”, o que não ocorreu.
“Consulta prévia, Livre e Informada não é uma reunião onde as pessoas falam aleatoriamente. É um processo. As comunidades que têm que se reunir para decidir o que elas querem pra elas”, disse Jaqueline Felipe, educadora da Federação de Órgãos Para Assistência Social e Educacional (FASE) a Adnan que tentava marcar uma consulta prévia de forma indiscriminada, sem atentar para os procedimentos jurídicos necessários para isso.
Povos e comunidades ignoradas
Sem a participação da população afetada, já há todo um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) feito e sendo apresentado pela SEMEDE, tentando mostrar os benefícios econômicos ao estado do Pará. Até mesmo um vídeo que enaltece o empreendimento foi mostrado durante a reunião e tem circulado nas redes socais. Para os povos indígenas e comunidades tracionais afetadas, o processo já está tão avançado ao ponto de se realizar Audiências Públicas, as quais deveriam acontecer somente após a Consulta prevista na OIT, ou seja, após a participação das comunidades nos estudos e as decisões delas sobre o projeto que irá percorrer do Sul ao Norte do Pará.
| Representante da associação das comunidades quilombolas questiona Adnan sobre a consulta à população
“As reuniões técnicas ocorrem agora em agosto. Em setembro, vamos começar a receber contribuições para o Edital. Em outubro as SEMAS devem fazer em todos os municípios audiências públicas, inclusive na região de Barcarena, em especial nas comunidades quilombolas que a Fundação Palmares autorizar. O Estado já autorizou a esta Fundação a autorização que ainda não foi autorizada. No momento em que autorizar vai se fazer as reuniões lá. Não há nenhuma possibilidade de tocarmos o assunto adiante se não tiver as audiências públicas com as comunidades por onde o projeto vai passar. Novembro é a publicação do Edital e se tudo der certo, em fevereiro a gente recebe a documentação e finaliza o processo em junho do ano que vem”, anunciou Adnan.
Frente à exposição do titular da SEDEME, Aurélio Borges, representante da Coordenação daas Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (MALUNGU), questionou a ignorância dada pelo projeto às populações de comunidades reconhecidas em nível estadual pelo Instituto de Terras do Pará. “Nós quilombolas levantamos uma preocupação muito grande. Quando se diz que a Palmares que a entidade que está sendo convocada para dizer pra nós, quilombolas, sermos consultados é um absurdo porque o estado do Pará tem jurisdição nacional e estadual. O estudo diz que o projeto vai respeitar áreas indígenas e quilombolas, mas ele considera as áreas que estão tituladas pelo INCRA. E como ficam as comunidades quilombolas tituladas pelo ITERPA?”.
Audiência em Barcarena
Presentes na audiência de Belém, os moradores de comunidades tradicionais de Barcarena cobraram explicações sobre a falta de aviso público em não ter sido realizada a audiência pública na localidade. Durante a sessão, Adnan tentou justificar dizendo que a audiência somente não havia ocorrido por aceitação da Secretaria ao pedido judicial do defensor público que acompanha o caso. No entanto, de forma contraditória, as redes sociais oficiais da SEDEME informam que a audiência em Barcarena não foi cancelada, mas adiada.
De acordo com Johny Giffoni, o defensor público que acompanha o caso, já na primeira fase do projeto, que envolve o estudo técnico de viabilidade econômica e financeira, houve violação dos direitos destas populações. Em razão disso, por meio da mobilização dos movimentos sociais, a defensoria pública encaminhou uma petição à justiça solicitando o cancelamento das audiências, para que as mesmas só possam ocorrer após a Consulta Prévia livre e Informada que, segundoele, deve ser feita de forma clara, concisa e explicativa aos povos e comunidades afetadas pelo empreendimento.
“O que deve ficar claro é que a SEDEME não necessita de autorização da Fundação Palmares para realizar a Consulta Prévia, livre e Informada com as populações tradicionais que estão na abrangência da área de estudo de impacto da ferrovia. A Sedeme precisaria antes de fazer o estudo de impacto realizar a consulta para todas as populações tradicionais, o que não foi feito. Essa seria a primeira fase. A segunda fase, a fase das audiências públicas, é para dar transparência, nortear o processo de licitação, de leilão, contratação da empresa que vai fazer o empreendimento, por isso que ela deve ser precedida da consulta prévia, livre e informada”, destaca o defendor.
Barcarena é um dos municípios atingidos pela Ferrovia. Deverá ser projetado como o polo de recebimento ao escoamento de todo o minério conduzido pelo trajeto de 1.2312 km do empreendimento que cortará outros 23 municípios, de Norte a Sul do estado, e que pretende exportar cerca de 170 milhões de toneladas ao ano de minerais aos mercados da China, Japão, Estados unidos e Europa.
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- 24/08/2017
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